Capítulo 39-Você vai estar segurando a minha mão do mesmo jeito
.Caminhei ao lado da cadeira de rodas, segurando a mão de Lucy, enquanto Helena guiava a cadeira pelos corredores frios do hospital.A seguiría até a sala de cirurgia e depois ficaria do lado de fora, torcendo pra que tudo desse certo, pra que ela voltasse pra mim.Ficava imaginando como sería o rosto de Cecília e como Lucy ficaría quando a visse.Me sentia ansioso o bastante, para esquecer um pouco o risco que Lucy corria.Na verdade já não estava preocupado.Era apenas uma tempestade sobre nós dois, algo que venceríamos.Eu não podia esquecer que nosso amor era mais forte que tudo, mais forte que a própria morte.
Entramos em um quarto pequeno, onde Lucy vestiu uma camisola verde e uma touca cobrindo os cabelos.Também vesti roupas especiais , a acompanhei e a ajudei a se sentar na mesa de cirurgia.
-Estou com medo.-Ela me olhou.
-Não precisa ter.Vai dar tudo certo, Lucy.Não pode acabar assim.-Me abaixei e peguei o rosto dela com as mãos.-Sei que não acredito em Deus, mas vou estar rezando, implorando pra que você sobreviva.-Lucy sorriu.Eu acariciei sua bochecha com o polegar e encostei minha testa na dela.-Eu não posso viver sem seu sorriso, Lucy.Por favor, não morra.
-Não vou morrer.
-Olá Sr. e Sra.Kaulitz.-Um homem de meia idade entrou na sala e nos comprimentou.-Meu nome é Simon e sou o anestesista.Lucy, preciso que você se curve um pouco pra frente.-Ele disse, dando a volta na mesa.Lucy se curvou e me lançou um olhar infantil, enquanto Simon descobria as costas dela.
-Aperte a minha mão.-Eu me abaixei e peguei a mão dela.
-Ai!-Lucy exclamou, apertando minha mão e fechando os olhos com força, quando Simon aplicou a anestesia em sua coluna.
-Pronto.-Ele disse.-Pode se deitar.Boa sorte.
-Obrigada.-Lucy sussurrou se deitando de costas.
Algumas enfermeiras entraram na sala, despiram Lucy, a cobriram com lençoes verdes e a enxeram de fios que ficavam ligados a vários tipos de máquinas.Dra.Honey entrou na sala, já vestida para a cirurgia.
-Olá, Bill.-Ela me comprimentou.-Conversei com os médicos dela, são mesmo excelentes, vão acompanhar o procedimento.Agora ela tem mais chances ainda!
-Isso é ótimo.
-Estou torcendo pra que tudo dê certo.
-Obrigado.
-Como se sente, Lucy?-Ela perguntou, afagando o braço de Lucy.
-Anestesiada.-Lucy sorriu.
-Ótimo.Não queremos que você sinta nenhuma dor.
Me agachei ao lado da mesa, peguei a mão de Lucy, encostei meu nariz no rosto dela.Apesar da mascara que eu estava usando estar tapando meu rosto, eu conseguia sentir aquele cheiro nitidamente.Cheiro de Lucy.
-Você vai sair daqui viva.Vamos vencer essa doença e ainda vamos fazer milhares de coisas.Vamos à maior roda gigante do mundo, em Singapura,vamos pular de para-quedas, bumg-jump e asa delta.Vamos andar de teleférico no Brasil e ver o cristo redentor de perto, andar de bicicleta pelos campos floridos da Holanda, fazer compras em Toquio, esquiar nos alpes Suíços, comer um monte chocolate Belga, dançar às margens do Siena em Paris, jantar na torre eifel de novo, visitar o Taj Mahal na Índia, surfar na Austrália...Sem contar as bodas...De ouro, prata, diamante...-Eu suspirei.-Você vai morrer um dia, Lucy.Mas não agora, nem desse jeito.
-Você acha?
-Claro.Você vai morrer numa noite estrelada, fazendo crochê para os nossos netos e eu vou morrer do seu lado, sentado na cadeira, segurando sua mão e olhando pro céu.
-Vamos estar velhos e cansados...
-Mas nosso amor vai continuar do mesmo jeito.-Eu beijei o rosto dela.-Aguente firme.Por favor, Lucy.Não me deixe sozinho no mundo.
-Você nunca vai estar sozinho.-Ela beijou as costas da minha mão.
-Bill, você precisa ir.-Dra.Honey disse.-A cirurgia vai começar.
-Seja forte, Lucy.Eu sei que você vai conseguir.
-Queria que você ficasse aqui comigo.Lembra que prometeu nunca mais me soltar?
-Lembro.Mas disseram que eu não posso ficar aqui dentro.
-Isso não importa, você vai estar segurando a minha mão do mesmo jeito.
-Eu te amo.-Me levantei e beijei a testa dela.-Minha Lucy.
-Eu também te amo e não importa o que aconteça, vou amar pra sempre, onde eu estiver.-Ela sorriu.-Me beija?
Eu apenas sorri e me curvei, como tinha feito quando a vi em coma.Talvez dessa vez, meu beijo a curasse e a salvasse da morte.Talvez dessa vez eu a salvasse de novo.Fechei meus olhos e a beijei de leve e demoradamente.
-Bill, sinto muito, mas vamos começar a cirurgia agora.-Dra.Honey disse, tocando meu braço com gentileza.
-Até logo, Lucy.-Eu acariciei o rosto dela e ela retribuiu o gesto.Nos olhamos por um tempo e depois virei as costas e saí da sala.Tom, Juliette e Jason estavam sentados em um banco num lado do corredor, enquanto Yoko, Amanda e Victor, estavam sentados em outro banco no outro lado.
-Vai dar tudo certo, mano.-Tom se levantou e me abraçou.
-Vai.-Eu disse, confiante.
Me sentei ao lado de Tom.Amanda roía as unhas, Victor folheava uma revista de moda e Yoko tentava não me olhar, mas eu percebia que ela me olhava com uma certa pena no olhar.
-Vocês...Também sabiam?-Eu perguntei a eles.
-Sabíamos.-Yoko respondeu, tremendo as pernas.
-Bill, desculpa...-Juliette disse.-Mas não sabíamos o que fazer, então...
-Pelo menos procuraram ajuda.Mesmo assim, eu queria ter sido informado sobre isso.
-Lucy nos fez prometer.-Jason disse.-Você sabe como ela é!
-Sei.Não tem como dizer não pra ela.
Victor deitou a cabeça no ombro de Amanda e começou a chorar.Amanda tentava acalmá-lo, me olhando apreensiva.Yoko fazia o mesmo.Aquilo fez meu coração disparar.Comecei a me sentir mais ansioso do que antes.E se Lucy não conseguisse?E se a Dra.Honey viesse andando pelos corredores, com uma expressão de derrota e me dissesse que o pior acontecera?O que eu faría?As portas do elevador se abriram e minha mãe saiu de lá.
-Mãe!-Eu corri e a abracei.Quando senti seus braços me rodeando, não consegui segurar o choro.
-Calma, filho.Eu estou aqui.-Minha mãe disse, afagando meus cabelos.
-Estou com tanto medo, mãe!
-Eu sei, mas você tem que ser forte, aconteça o que acontecer.
-Eu não sei o que vai ser de mim se eu perder a Lucy.
-Bill,-Minha mãe pegou meu rosto com as mãos e olhou nos meus olhos.-Precisa ser forte, meu filho.Vai ter uma filha e ela precisa muito de você.
-Eu sei, mas...Não quero ficar sem Lucy.
-Tenha fé.E lembre-se que nada é por acaso.
Nos sentamos no banco e Tom ficou abraçado com nossa mãe, enquanto eu deitei a cabeça no ombro dela.Fechei os olhos e tentei me acalmar, pensar positivo.Pedi a quem quer que estivesse me ouvindo, pra que não deixasse Lucy morrer.Eu precisava dela, mais do que tudo.
Quando abri os olhos, vi todos se levantarem e olharem para o fim do corredor.Olhei naquela direção.Dra.Honey vinha com uma expressão preocupada no rosto.A expressão que eu temia.Engoli em seco.
-Correu tudo bem.-Ela disse, parando na minha frente.-Lucy está bem e já foi para o quarto.Mas perdeu muito sangue e está fraca.Fizemos mais alguns exames e estou aguardando os resultados.
-E minha filha?-Eu perguntei, me sentindo aliviado por saber que Lucy estava bem.
-Está no berçario.-Ela sorriu.-É no primeiro andar.
Desci para o primeiro andar e andei pelos corredores, ansioso.Cheguei ao berçário.Helena estava lá dentro.Ela me olhou e sorriu, apontando para um dos bercinhos ao seu lado.Eu espalmei as mãos no vidro e olhei para Cecília.Ela estava com os olhos fechados, e as mãozinhas perto do rosto.Estava toda agasalhada e com um gorrinho roxo na cabeça.Eu queria tocá-la, sentir sua pele macia, queria pegar sua mãozinha minúscula.Eu ria e chorava ao mesmo tempo.Enquanto os outros diziam que ela era linda e tão pequena, eu não conseguia dizer nada.
-Minha netinha!-Minha mãe disse, me abraçando e chorando.
-Ela é linda, mãe.
-Tenho tanta saudade de quando você e Tom eram daquele tamanho.
-Posso entrar?-Gesticulei para Helena, apontando para a porta.
-Pode.-Ela balançou a cabeça afirmativamente.
Abri a porta e entrei.Haviam vários bebês, dormindo naquele pequeno quarto à prova de som.Tinha um cheiro agradável e uma atmosfera pacífica.Helena pegou Cecília e me entregou.A peguei com cuidado, morrendo de medo de deixá-la cair.
-Oi, filha.É o papai.-Eu disse, beijando o rostinho dela.Ela abriu os olhos e me olhou, curiosa.Peguei uma de suas mãozinhas.Ela apertou meus dedos com força e com as duas mãos.
-Cecília é muito esperta, Bill.Se mexe o tempo inteiro.
-Puxou seu tio, né filha?-Eu ri.
-Acho que ela puxou mesmo.-Helena riu.-De tranquila só tem a pose.
-Lucy viu ela?
-Viu.Ficou encantada.
-Quando vai levar Cecília para o quarto dela?
-Quer levá-la agora?
-Quero.
A deitei no berço, que na verdade era uma espécie de carrinho.Helena abriu a porta e eu empurrei o carrinho para fora do berçário.
-Que linda!-Juliette exclamou, tocando o rosto de Cecília.
-Oi, pequena!-Minha mãe disse.
Todos os outros rodearam o bercinho e ficaram paparicando Cecília.Ela olhou pra todo mundo e começou a chorar.
-Vocês estão assustando ela!-Eu ri.
-Ii!Ela não puxou o Tom.-Juliette disse.
-O que você quis dizer com isso?-Tom perguntou.
-Quis dizer que você adora atenção.
-Fala pra ela que ela está errada, Cecília.Se tem alguém aqui a quem você puxou, esse alguém sou eu.Fala pra ela, Ceci!Defende o titio!
-Vamos levá-la para o quarto!-Eu exclamei.
Empurrei o carrinho para o elevador e depois para os corredores do terceiro andar, seguindo Helena.Ela parou em frente à uma porta e a abriu.Todos entraram primeiro e eu entrei por último.Lucy estava deitada na cama.Estava fraca e debilitada.Tinha uma expressão cansada e olheiras profundas em seu rosto.Mas quando ela viu nossa filha, seu rosto se uliminou e ela sorriu.
-Traga ela aqui, Bill!-Sua voz saiu fraca.Eu peguei a Cecília e a levei até Lucy.Ela não conseguiu se sentar, então deitei Cecília de bruços sobre o peito da mãe.-Oi, filha!-Lucy disse, colocando uma mão sobre as costas de Cecília.
-Conta pra sua mãe, que você se assustou com todo mundo!-Eu disse, me deitando ao lado de Lucy e pegando a mãozinha de Cecília.-Menos com o papai, é claro.
-É verdade?
-É mamãe, eu não gosto de atenção.
-Puxou seu pai, é?
-Eu?O que eu tenho a ver com isso?
-É.Você adora ficar sozinho, pensando.
-É que eu gosto da sua atenção.-Eu sussurrei no ouvido de Lucy.
-Ei, vocês dois!Vamos parar com essa melação?-Tom disse, abraçando Juliette por trás.-Tem menores de idade aqui nesse quarto.
-Você ouviu, né Yoko.Pode sair!-Victor riu.-Gueixas são atentados ao pudor!
-Engraçadinho.-Yoko respondeu.
Todos pegaram Cecília, até as enfermeiras e os médicos.Eles ficavam encantados, dizendo que ela era o bebê mais lindo que já viram.Eu concordava.Cecília era metade de mim e metade de Lucy.Tinha uns fios loiros em sua cabeça, o nariz era igual ao meu e a boca igual a de Lucy.Seus dedinhos eram compridos e finos, como os meus e suas unhas eram grandes.Ela tinha covinhas em suas bochechas e ficava furiosa quando sentia fome.Como a vida podia ser tão feliz e tão triste ao mesmo tempo?
Capítulo 40-Claro que não estou feliz, Bill.Eu a amo.
Todos os outros foram embora, pra descançarem, já que Lucy não corria riscos.Dormi abraçado a ela, olhando para o bercinho de Cecília.Dra.Honey entrou no quarto de Lucy e me acordou.
-Bill, eu preciso falar com você.-Ela sussurrou.
-Agora?-Eu disse, me levantando devagar.
-É!-Ela afirmou.Ela saiu andando e eu a segui pra fora do quarto.
-E então?-Eu disse, fechando a porta.
-Eu sinto muito, Bill.Mas as notícias não são boas?
-O quê?
-Lucy precisa de uma doação de medúla, urgentemente.
-Em quanto tempo?
-Não sei dizer, Bill.Ela tem alguma irmã?
-Não.
-Bem, você precisa achar alguém que seja compatível ou ela vai morrer.
-Mas onde?
-Não sei!Ligue para seus amigos...Os amigos dela!Corra, Bill.Ainda dá tempo!
Peguei meu celular e andei de um lado para outro do corredor vazio.Liguei para todo mundo que conhecia.Estava desesperado.Não podia deixar Lucy morrer, não agora.Voltei para o quarto e me deitei ao lado de Lucy.
-Bill, o que foi?-Ela perguntou.
-Nada.-Eu respondi.
-Eu sei quando você não está bem!O que aconteceu?
-Não se preocupe comigo.Descanse.
Cecília começou a chorar.Me levantei, ajudei Lucy a se sentar e entreguei Cecília a ela.
-Ela está com fome.-Lucy disse, colocando o seio na boca de Cecília, que se calou na hora.
-Que menina gulosa.-Eu disse.-Se Gustav fosse nosso parente, isso se explicaria.
-Não consigo acreditar que ela está aqui.-Lucy disse, acariciando o rosto de Cecília.
-Sabia que eu amo rodas gigantes?-Eu ri, me sentando ao lado de Lucy e a abraçando.
-Eu ouvi você ligando pra um monte de gente.
-Ham?
-Não se faça de desentendido, Bill.Eu sei que ainda não estou salva.
-Não quero que se preocupe com isso.
-Eu estou morrendo, Bill.Não adianta.Não vamos achar alguém compatível.
-Não fale assim.Eu ainda estou lutando por você.
Horas depois minha mãe entrou no quarto e pegou Cecília no colo.
-Oi, minha netinha linda!-Ela disse, embalando minha filha.-Ela se parece tanto com você, Bill.
-Também acho, Simone, mas Bill ainda insiste em dizer que ela se parece comigo.-Lucy disse.
-Eu não disse isso!-Eu ri.-Eu disse que ela se parece com o Tom.
-Que é o mesmo que dizer que ela se parece com você!-Minha mãe disse, rolando os olhos.
-Que menina de sorte, não?
-Oh, Narciso.-Minha mãe retrucou.-Tom quer falar com você.
-Tá.-Eu me levantei e saí.
Tom estava encostado na parede, do outro lado do corredor.
-Cara, todos nós fizemos os exames.Até Georg e Gustav vieram, mas ninguém é compatível.
-Droga!
-Falta você.
-Tomara que eu seja.
Segui Tom até o primeiro andar.Todos os outros estavam no corredor, com expressões apreensivas e apáticas.Entrei numa das salas, onde havia uma enfermeira ruiva, sentada ao lado de uma mesa cheia de seringas.
-Olá, sou Bill e vim fazer o teste.-Eu disse.
-Oi, Bill.Você é o marido dela, não é?-A ruiva me disse.
-Sou.
-Prazer, meu nome é Alexia.
-Prazer.
-Sente-se e ponha o braço sobre o suporte.-Ela disse.Eu fiz o que ela pediu.Eu odiava tirar sangue e aquela dor irritante da agulha entrando na veia, mas precisava fazer isso...Por Lucy.Alexia amarrou um elástico amarelo no meu braço.Eu virei o rosto e senti aquela dor aguda e chata no braço.-Pronto.-Ela disse, massageando minha pele com um algodão.
-Já fizeram o teste em Cecília?
-Não.
-Poderíam.
-Claro.Vou subir até o quarto de Lucy.
-E quanto às células do cordão umbilical?Ouvi dizer que podem curar esse tipo de coisa.
-Sim, mas nós tentamos.O corpo de Lucy rejeitou.
Saí para o jardim do hospital e ascendi um cigarro enquanto esperava pelo resultado.Tom me acompanhou.
-Ai, cara.Eu...Estou com medo!-Ele disse, soltando a fumaça de seu cigarro.
-Não vai dar certo, Tom!-Eu comecei a chorar.-Ela vai morrer!
-Não pode pensar assim, tem que...
-Pensar positivo?Eu pensei e não adiantou.A vida não quer eu fique com Lucy.
-Tem que ter fé, Bill.-Tom pôs a mão no meu ombro.
-Fé.
Eu apaguei o cigarro e virei as costas.Voltei para o terceiro andar e entrei em uma espécie de capela.O teto era pintado de azul, com nuvens brancas desenhadas.Se parecia muito com o quarto de Cecília.Me sentei em um dos bancos e fiquei olhando para as imagens de santos que estavam espalhados pelo altar.Havia uma cruz pregada na parede, logo acima dele, com uma imagem de Jesus crucificado.
-Nunca pensei que fosse fazer isso.-Eu disse, ouvindo o minha voz ecoar pelo lugar.-Aliás, eu não acredito muito nisso, mas é minha última chance.Deus, se você existir mesmo e estiver me ouvindo...Bem, eu queria pedir desculpas por ter te ignorado por tanto tempo.Mas é que não tive muitos motivos pra acreditar em você.Eu preciso de Lucy, Deus.Por favor, não tire ela de mim.Eu a amo mais do que tudo.O jeito como nos conhecemos, foi tudo tão mágico!Não acabe com isso agora.Por favor!
Me levantei e caminhei até o altar.Olhei para a imagem crucificada.A expressão de sofrimento no rosto daquela imagem.Talvez toda aquela história tenha sido lenda ou talvez não.Eu sei que naquela manhã eu implorei pra que aquele cara, me ouvisse.Eu não prometi nada, como sei que muita gente faría.Não estava negociando com ele.Estava apenas implorando por um milagre, como quando implorei para conhecer aquela garota do acidente, como quando implorei para ter uma nova chance e para poder amá-la.
Saí da capela e fui para o quarto de Lucy.Ela estava deitada na cama, com Cecília ao seu lado.Ela ficava acariciando e admirando o rosto da nossa filha.
-Oi, meu amor.-Ela sorriu, ao me ver.
-Oi, querida.-Me agachei ao lado da cama.Acariciei o rosto de Cecília e depois peguei a mão de Lucy.
-Tiraram sangue da Cecília.Ela chorou tanto!
-Eu vou conseguir achar alguém, Lucy.Nem que pra isso eu tenha que procurar na cidade inteira.-Eu disse, beijando as costas da mão dela.
-Eu te amo.
-Não me deixe, Lucy.Aguente mais um pouco.Eu vou conseguir.
-Eu sei que vai fazer o possível.-Ela tocou meu rosto.-Estou com a boca seca, Bill.Busque um pouco de água pra mim?
-Claro.
Me levantei e saí do quarto.Caminhei até o fim do corredor, onde havia um filtro, peguei um copo de água e voltei para o quarto.Lucy estava com os olhos fechados, segurando a mão de Cecília.Caminhei até o lado dela, me sentei na cama e pousei o copo sobre o criado-mudo.Me abaixei e beijei o rosto dela.
-Lucy.-Eu chamei, sorrindo.-Acorde, minha preguiçosa.Eu trouxe sua água.Você dorme muito rápido, sabia?-Eu beijei os lábios dela.Não senti o ar saindo de seu nariz.-Lucy!-Eu disse, balançando o corpo dela.-Isso não tem graça.Acorde!-Ela não respondia.-Lucy!-A abracei e comecei a chorar.-Não faz isso comigo, Lucy.Por favor, acorde!
-Bill, o que houve?-Yoko entrou no quarto.-O que aconteceu?
-Ela morreu, Yoko!-Eu chorava, abraçando Lucy com força.
-Não!-Ela disse, levando a mão a boca.-Eu vou buscar ajuda!
Ela saiu correndo, enquanto eu apertava o corpo inanimado de Lucy.Me lembrei de todas as vezes que ela me olhou com seu olhar inocente ou acusador.Me lembrei de nossas brigas e do fim delas.Me lembrei dos nossos beijos mais sutis e os mais selvagens, da voz dela cantando pra mim, de quando ela me ensinou a dançar...E agora ela estava morta.
-Bill, o que aconteceu?-Tom entrou no quarto, seguido por Juliette.
-Minha filha!-Jason disse, se sentando do outro lado da cama e pegando a mão de Lucy.-Não!
-Ela está...?-Juliette balbuciou, se aproximando devagar, espantada.
-Por quê você fez isso comigo, Lucy?-Eu estava desesperado.Estava acabado, não tinha esperança.
-Lucy!-Ouvi uma voz conhecida, entrando pelo quarto.
-O que você está fazendo aqui?-Eu disse, irritado.-Ela morreu!
-Não.-Dr.Morten disse, com tristeza.Andou até mim e afagou os cabelos de Lucy.
-Está feliz, Morten?No fim das contas nenhum de nós pôde ficar com ela!
-Claro que não estou feliz, Bill.-Seus olhos estavam encharcados.-Eu a amo.-Ele pegou a mão dela.
-Solte ela!-Eu gritei.
-Ela ainda está viva!
-O quê?
-Yoko.Chame a médica dela e alguns enfermeiros também.-Ele gritou.Yoko saiu correndo de novo.
-Lucy está viva?
-Sua pulsação está fraca, mas ela ainda está viva.
Alguns enfermeiros entraram, trazendo uma maca pra perto da cama.Tom me puxou pelo braço.Eu tentei resistir, mas ele me olhou com uma expressão firme, o que me fez afastar.Dr.Morten a pegou no colo, a deitou sobre a maca e a levou pra fora do quarto.Juliette segurou Cecília, que começou a chorar, assustada.Saí do quarto e fui atrás de Lucy.Os enfermeiros entraram em uma sala e fecharam a porta.Me sentei no chão, do lado de fora.Nada daquilo adiantaría, eu não tinha achado ninguém que pudesse doar a médula para Lucy.Era tarde demais...Eu estava sozinho.